7 de Setembro mostrou — e imprimiu nas páginas da história

16/09/2022 17:06

A RECEITA DE KU KLUX KLAN

Diante das aterrorizantes imagens do 7 de Setembro, Lula teve a brilhante ideia de comparar os atos que também comemoravam o bicentenário da nossa Independência com os da Ku Klux Klan

Por Ana Paula Henkel – Revista Oeste

Eentão veio a ressaca — aquela ruim, que traz uma dor de cabeça insuportável — do 7 de Setembro. Eles mal puderam abrir os olhos e acreditar no que estavam vendo. Como assim milhões de brasileiros foram às ruas apoiar um governo em fim de mandato? Como assim milhões de pessoas estiveram juntas em centenas de cidades pelo país celebrando as cores e a bandeira do Brasil, pedindo respeito à Constituição e nenhuma lata de lixo foi revirada? Nenhuma briga foi reportada, nenhuma vidraça foi quebrada e nenhum prédio depredado? Meu Deus! Os ungidos estavam certos, isso é a cara do fascismo.

Mas, para a patota que anda de mãos dadas com a imprensa de necrotério (ou do “despiora”) que ficou na torcida por um 6 de janeiro tupiniquim, não bastou tentar pintar um quadro de horror com as manifestações pacíficas, ordeiras e democráticas que encheram ruas e avenidas de girassóis humanos. Eles foram além. Diante de imagens aterrorizantes de uma congregação histórica de brasileiros de várias etnias, idades e religiões, o ex-presidente e ex-presidiário Lula teve a brilhante ideia de comparar os atos que também comemoravam o bicentenário da nossa Independência com atos da Ku Klux Klan, grupo de terrorismo doméstico fundado logo após o fim da Guerra Civil dos Estados Unidos, em 1866, no Tennessee. Para manter a supremacia branca nos governos do sul após e derrota dos confederados para o exército da União de Abraham Lincoln, a KKK usava extrema violência e intimidação contra negros e brancos que ousassem ajudar outros negros a ascender na sociedade.

Manifestação pró-governo no 7 de Setembro, em comemoração ao Bicentenário da Independência do Brasil | Foto: TV Brasil

Apesar de ter virado chacota em todo o Brasil depois de vociferar em um microfone que as manifestações pareciam uma reunião da “cuscuz clã”, podemos usar as ofensas do corrupto de estimação do STF para esclarecer mais uma falácia imensamente propagada pelos “jornalistas e correspondentes” internacionais no Brasil, assim como membros do consórcio na América. Ao contrário do que tentam empurrar os “regressistas” (sim, não há nada de progresso nos tais progressistas) na educação e na mídia, a história do Partido Democrata até o século 20 é uma história praticamente ininterrupta de roubo, corrupção, intolerância e racismo. Para isso, basta apenas voltarmos nas páginas da história. Detalhes chatos que esquerdistas não apreciam, mas está tudo lá.

O partido da escravidão

Os democratas sempre foram o partido da escravidão, e a mentalidade escravagista continua a moldar as políticas dos líderes democratas hoje, até para usar as minorias apenas como simples massa de manobra e manutenção de poder político. A questão não é que os democratas inventaram a escravidão, que é uma instituição antiga que antecede em muito a América. Em vez disso, democratas inventaram uma nova justificativa para a escravidão, a escravidão como um “bem positivo”.

Muitos insistiam que a escravidão não era benéfica apenas para os senhores; diziam que também era bom para os escravos. Hoje, “especialistas” tentam esconder a cumplicidade dos democratas na escravidão nos EUA, culpando o “Sul” pela nefasta prática. Essas pessoas teceram todo um fio que que tenta retratar de maneira simplista a batalha da escravidão como uma batalha entre o Norte antiescravagista e o Sul pró-escravidão. É claro que isso beneficia os democratas no atual cenário político, porque hoje a principal força do Partido Democrata está no Norte e, a do Partido Republicano, no Sul.

Mas a questão da escravidão não era principalmente uma questão Norte-Sul. Na verdade, foi uma batalha entre os democratas pró-escravidão e os republicanos antiescravidão. Isso não é uma mera opinião, está nos livros de história. Basta visitarmos suas páginas e veremos que os democratas do norte, como Stephen Douglas, protegiam a escravidão, enquanto a maioria dos sulistas não possuía escravos. Basicamente três quartos daqueles que lutaram na Guerra Civil do lado confederado não tinham escravos e não estavam lutando para proteger a escravidão.

Enquanto isso, todos os republicanos, em um grau ou outro, se opunham à escravidão. O próprio Partido Republicano como conhecemos hoje foi fundado exatamente para acabar com a escravidão. É claro que havia uma variedade de pontos de vista entre os republicanos, de abolicionistas que buscavam acabar imediatamente com a escravidão a republicanos como Abraham Lincoln, que reconheciam que isso era uma questão também constitucional e politicamente impossível de resolver da noite para o dia. Então, eles se concentraram em impedir a extensão da escravidão aos novos territórios. Esta foi a principal plataforma com a qual Lincoln venceu a conturbada eleição de 1860. Como ele resumiu em seu primeiro discurso de posse, “um lado acredita que a escravidão é certa e que deve ser estendida aos novos Estados, e o outro acredita que é errada e deve ser restrita”. Como disse Lincoln no famoso discurso, “esta é a única disputa substancial”.

O tal “ódio da classe média” da boca de Marilena Chauí, companheira do ex-presidiário, nunca foi tão visceral para todos eles

Após a guerra que mais matou norte-americanos em sua história, os republicanos acabaram com a escravidão e baniram a prática permanentemente através da Décima Terceira Emenda. Os democratas responderam agressivamente se opondo à emenda e um grupo de membros do partido planejou e assassinou Abraham Lincoln, o homem que consideravam responsável pela emancipação dos negros. Os republicanos aprovaram então a Décima Quarta Emenda, garantindo aos negros direitos iguais perante a lei, e a Décima Quinta Emenda, que deu aos negros o direito de votar. Tudo isso com violenta oposição dos democratas.

Os votos de homens anteriormente escravizados ajudaram a dar ao Partido Republicano o controle da legislatura do Estado do Mississippi, o que fez de Hiram Rhodes Revels o primeiro afro-americano no Senado dos Estados Unidos. Em 1870, a Carolina do Sul elegeu diretamente Joseph Rainey também pelo Partido Republicano, outro afro-americano, para a Câmara dos Representantes dos EUA. A Ku KLux Klan reagiu com manifestações noturnas aterrorizantes com homens encapuzados e tochas de fogo nas casas dos eleitores negros. Em todo o Sul, o linchamento e a intimidação eram predominantes. A KKK usou sigilo, intimidação, violência e assassinato para impedir que homens negros anteriormente escravizados votassem. Homens brancos que porventura usassem seus cargos e profissões para ajudar negros e seus apoiadores também viraram alvos do terror da KKK. Tudo para que a plataforma de Era da Reconstrução, que também visava a dar aos negros direitos sociais, políticos e econômicos, não avançasse.

Ku Klux Klan, com uma cruz queimando no Tennessee, 4 de setembro de 1948 | Foto: Shutterstock

Depois que a Reconstrução terminou, em 1877, as legislaturas estaduais foram capazes de implementar as leis de Jim Crow que garantiam a superioridade e a segregação dos brancos. Os eleitores negros foram intimidados ou simplesmente impedidos de se registrar e votar. As novas leis colocaram obstáculos quase intransponíveis. A Ku Klux Klan inicial se desfez na década de 1870, em parte por causa de leis federais, mas também porque seus objetivos foram alcançados nos Estados. A organização seria revivida no início do século 20 com seu retrato falsamente heroico no filme O Nascimento de uma Nação (The Birth of a Nation), aclamado pelos democratas, e o afluxo de imigrantes católicos e judeus da Europa Oriental ofereceu um novo alvo para o preconceito da KKK.

Atualmente, muitos democratas se defendem dizendo que a escravidão acabou em 1865 e que, por isso, não podem ser colocados no balaio da culpa pelos erros pré-guerra do Partido Democrata. Fato. Porém, a digital segregacionista do partido vai do apoio à escravidão à cumplicidade na Ku Klux Klan. A organização fundada por um grupo de ex-soldados confederados teve como primeiro grande líder um general que também foi delegado na Convenção Nacional Democrata. A KKK, como mostra a história, logo se espalhou do Sul para o Centro-Oeste e o Oeste. Nas palavras do historiador Eric Foner, ela se tornou “o braço terrorista doméstico do Partido Democrata que, na década de 1880, inventou a segregação e as leis Jim Crow que duraram até a década de 1960”. Líderes democratas, incluindo pelo menos um presidente, dois juízes da Suprema Corte e inúmeros senadores e congressistas, eram membros da Klan. O último deles, Robert Byrd, morreu em 2010 e foi elogiado pelos ex-presidentes Barack Obama e Bill Clinton.

A história sórdida do Partido Democrata no início do século 20, fortemente escondida e blindada pela imprensa a até por historiadores, é casada com a história abominável do movimento progressista durante o mesmo período. “Progressistas” como Margaret Sanger, fundadora da Planned Parenthood, cadeia de clínicas de aborto espalhadas por todo o país — e elogiada publicamente por Hillary Clinton — apoiaram causas como a eugenia e o darwinismo social. Embora o aborto não fosse um problema na época de Sanger, ela apoiou a esterilização forçada de pessoas “impróprias”, principalmente negros e minorias. O projeto do modelo de feminismo para as democratas foi especificamente focado na redução da população negra, e clínicas abortivas foram implantadas majoritariamente nas comunidades e bairros negros nos Estados Unidos.

Ku Klux Klan, na área de Panhandle, Flórida, Estados Unidos, em 1995 | Foto: Shutterstock

Os regressistas democratas

Pois é, pouco disso é conhecido pelas pessoas hoje, porque os regressistas democratas fizeram um bom trabalho varrendo tudo para debaixo do tapete, assim como andam tentando reescrever o que — de fato — aconteceu durante a pandemia. Essas páginas são simplesmente deixadas de fora dos livros didáticos, debates, reportagens e informações passadas na TV, embora tudo esteja documentado no registro histórico. Há anos, eles têm trabalhado arduamente para distorcer, esconder e até mentir sobre esses fatos. E, para isso, têm todo um contingente cultural — a grande mídia, Hollywood, as universidades de elite e agora até mesmo o esporte — para vender sua propaganda e as páginas editadas de seu ministério da verdade.

Curiosamente, o Partido Republicano não é apenas o partido dos direitos dos negros, mas também dos direitos das mulheres. Os republicanos incluíram o sufrágio feminino na plataforma do partido já em 1896. A primeira mulher eleita para o Congresso foi a republicana Jeanette Rankin, em 1916. Naquele ano, o partido teve um apoio excepcional defendendo o direito de voto para as mulheres, então, depois que os republicanos recuperaram o controle do Congresso, a Décima Nona Emenda concedeu o sufrágio feminino, e voto feminino foi finalmente aprovado, em 1919, sendo ratificado pelos Estados no ano seguinte.

Apesar de toda a sua intenção assassina, Leon Trotsky, comunista e líder na Revolução de Outubro de 1917, na Rússia, uma vez tropeçou num pedaço de projeto de sabedoria que viveu através dos tempos. No auge de uma das maiores instabilidades na Europa, Trotsky escreveu que, às vezes, há um limite para o diálogo. Quais são as opções para argumentarmos com pessoas que nos desumanizaram e que determinaram que somos — de qualquer maneira — o pior inimigo? Em que ponto alguns perceberão que o outro lado não está disposto a visitar nenhuma lógica e está determinado a nos esmagar pelo poder político?

O curioso é que as elites esquerdistas brancas explicam muito sobre menosprezo. Ao focar em xingamentos e no suposto racismo das classes trabalhadoras e de movimentos populares democráticos e patrióticos que rejeitam as ideias dessas bolhas hedonistas disfarçadas de tolerantes, eles pensam que encontram isenção para suas próprias vidas segregacionistas. O tal “ódio da classe média” da boca de Marilena Chauí, companheira do ex-presidiário, nunca foi tão visceral para todos eles.

O 7 de Setembro mostrou — e imprimiu nas páginas da história — imagens que incomodarão os incautos por muito tempo. Mas, além disso, o 7 de Setembro levantou espelhos para que aqueles que têm ódio do Brasil e de sua gente pudessem ver e expor a real imagem de uma hipocrisia.