A culpa agora é da vítima

15/08/2015 21:12

Por Heron Guimarães

A culpa agora é da vítima

Em entrevista ao jornalista Eduardo Costa, na rádio Itatiaia, na tarde de ontem, um oficial da PM foi, no mínimo, infeliz ao tentar justificar o disparo de uma bala de borracha contra um de nossos fotógrafos na manifestação contra o aumento da passagem e do uso de força tido como desproporcional pelos organizadores dos movimentos Tarifa Zero e Passe Livre, na última quarta-feira.

Primeiramente, o oficial deu a entender que a intenção era mesmo de ir para o confronto, sem se preocupar em promover um diálogo entre as partes envolvidas. De certa forma, isso fica evidente porque a manifestação, por mais contestável que fosse, já havia sido marcada com certa antecedência, e nenhum sinal entre as partes ocorrera no sentido de “preparar o clima”.

A verdade é que ninguém imaginava reação tão violenta por parte da polícia depois de um tempo agindo como instituição pacificadora, mas o policial em questão afirmou que a culpa de nosso jornalista ser atingido era exclusivamente dele, “que não soube se posicionar durante o confronto”, e da empresa que o contratou, ou seja, do próprio jornal, que o não o preparou para o que estava por vir.

Fez questão de frisar que jornalistas que cobrem guerras já sabem como lidar com isso. Só não disse que uma manifestação feita, em sua maioria, por estudantes era uma guerra. Para o policial, o repórter teria que ir para a manifestação, a princípio pacífica, todo paramentado.

Justificou que um “curso” ministrado pela PM durante a Copa do Mundo do ano passado já “ensinava” como profissionais da imprensa devem se comportar na hora de um “pega para capar”.

Usou também o argumento de que a força proporcional, segundo ele, foi necessária para garantir o direito de ir e vir, o mesmo direito que não foi observado no caso da estudante Débora Santos, de 25 anos, que não participava do protesto, mas, ao passear de bicicleta pelo local, também foi atingida por uma bomba. Ela, no caso, não recebeu orientações de como sair da frente do Choque.

Não há por parte desta coluna nenhuma pretensão de dizer para a polícia o que ela deve ou não fazer, mas há, sim, um alerta a ser feito: os porta-vozes da PM devem se preparar melhor para “justificar” seus atos, já que esses são, ao que parece, mais instintivos do que deveriam ser.

Certamente, sabendo agora que o comando da PM trata manifestações populares como conflitos bélicos, nossos jornalistas e fotógrafos sairão para as ruas pensando no pior. Assim também devem se comportar ciclistas e pedestres como Débora, ao verem uma viatura, pois, a qualquer momento, o jornalista ou a estudante, o advogado, a dona de casa ou qualquer um que passar pela rua, pode ser atingido por um disparo feito a menos de cinco metros de seu alvo.

 

Fonte: Jornal O Tempo - Belo Horizonte - Minas Gerais