Aproposta de reforma tributária apresentada

23/07/2021 11:57

UBIRATAN IORIO: ‘A REFORMA TRIBUTÁRIA É UM ‘REMENDO’’

Segundo o economista, o Estado é do tamanho de um elefante e as ‘forças do establishment’ não permitem maiores avanços

Por Fábio Matos – Revista Oeste

Aproposta de reforma tributária apresentada pelo governo federal ainda é “muito tímida” diante do que o país precisa para diminuir o tamanho do Estado, dinamizar a economia e aumentar investimentos. A avaliação é do economista, professor e escritor Ubiratan Jorge Iorio, colunista da Revista Oeste.

Um dos itens mais criticados do texto é a retomada da tributação sobre lucros e dividendos (parcela do lucro distribuída aos acionistas) das empresas, que vigorou até 1995. Atualmente, os dividendos são isentos de impostos. O Ministério da Economia prevê uma alíquota de 20% na fonte e, ao mesmo tempo, uma isenção de R$ 20 mil para microempresas e empresas de pequeno porte.

“Essa ideia de tributar dividendos é uma coisa que a gente não esperaria de um liberal, a não ser em situação de desespero no sentido de ter de gerar receita para cobrir gastos imprevistos”, critica Iorio. “O Brasil precisa de menos impostos. É um erro taxar dividendos. O país precisa de capitais.”

Diante de forte reação do empresariado contra a primeira versão da reforma, o relator da proposta na Câmara, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), fez mudanças em relação ao texto original. Ele estipulou um corte de 12,5 pontos porcentuais na tributação do Imposto de Renda (IR) sobre as empresas, retirou a cobrança de imposto sobre dividendos quando o lucro for distribuído entre subsidiárias de uma mesma holding e eliminou a taxação de 15% sobre os rendimentos de fundos de investimentos imobiliários, entre outros pontos.

Segundo Iorio, os ajustes são necessários e foram positivos, mas a proposta, em linhas gerais, poderia ter sido mais ousada. “O problema é que essa reforma, como tantas outras que tentaram fazer, é um remendo. Não mexem no tamanho do Estado. O Estado é do tamanho de um elefante”, afirma.

Leia os principais trechos da entrevista

Como o senhor avalia a proposta de reforma tributária apresentada pelo governo?

O governo tentou apresentar uma reforma tributária no ano passado, e a coisa foi sendo adiada. As pessoas são a favor, mas desde que não mexa com elas. Essa última proposta, além de ser muito tímida, vai criar um imposto novo sobre dividendos. Conheço o ministro Paulo Guedes, da Economia, trabalhei com ele por mais de 15 anos e sei que ele é um liberal e quer diminuir a carga tributária. Mas as forças políticas não permitem isso. O ponto essencial é que a equipe econômica está sendo obrigada a colocar o carro na frente dos bois. Qualquer reforma tributária deveria ser precedida por uma reforma administrativa, pelo enxugamento do Estado. Apesar de Paulo Guedes ter afirmado que, com o tempo, vai reduzir a carga tributária, essa ideia de tributar dividendos é uma coisa que a gente não esperaria de um liberal, a não ser em situação de desespero no sentido de ter de gerar receita para cobrir gastos imprevistos. A ideia de aliviar o Imposto de Renda é boa, mas o presidente foi eleito prometendo que reduziria a carga tributária e simplificaria os impostos. E a proposta não simplifica nada.

Tributar dividendos é um equívoco?

Todos os economistas que conheço da linha liberal-conservadora estão reagindo muito mal a essa proposta. Alguns até estão dizendo que o ministro não tem nada de liberal. Como eu o conheço, sei que não é isso. Ele sabe que, mesmo que passe uma reforma, não vai ser a ideal. Então, alguém de dentro da Receita deve ter apresentado esse projeto e, como ele viu que geraria uma receita necessária, acabou encampando. Tenho elogiado muito a gestão de Paulo Guedes, mas com relação aos impostos tenho críticas. Ele parece ter uma verdadeira obsessão de recriar, com outro nome, a CPMF — aquele imposto maluco sobre transações financeiras. O Brasil precisa de menos impostos. 

“É fundamental tirar o peso do Estado das costas dos pagadores de impostos”

Em relação ao Imposto de Renda para empresas, o governo pretendia inicialmente fazer uma redução gradual da alíquota, de 25% para 20%, em um período de dois anos. Qual é sua avaliação sobre esse item?

A redução do imposto para as empresas é benéfica. Mas o problema é que essa reforma, como tantas outras que tentaram fazer, é um remendo. Eles não mexem no tamanho do Estado. O Estado é do tamanho de um elefante. Primeiro, eles tinham de diminuir e transformar o elefante, sei lá, em um cachorro. Os políticos não deixam. As forças do establishment não deixam. Então, eles vão ter de continuar alimentando o elefante. 

Além da proposta em tramitação na Câmara, o Senado se debruça sobre um projeto que unifica nove tributos. É uma boa solução?

No sentido de simplificar nosso manicômio tributário, essa proposta é boa. Agora, o que a gente tem de ver é se ela vai simplesmente pegar esses tributos todos e somar ou se vai abolir alguns. 

Outra mudança que consta da proposta do governo é a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para pessoa física, que passaria para R$ 2,5 mil. Essa mudança deve dobrar a quantidade de brasileiros que se livrarão do Fisco. Como o senhor avalia essa medida?

Sou contra o Imposto de Renda. Acho que se deveria taxar só consumo. Mas, já que ele existe, a proposta é positiva. Alguns tributaristas e economistas mais ligados nessa área estão criticando, no sentido de que esse aumento da faixa de isenção seria muito tímido. No fundo, é tudo um remendo. Conserta um pouquinho e, daqui a três anos, vai ter de remendar de novo. É o Brasil, infelizmente. 

Qual é a importância da reforma tributária para o Brasil? É possível que o texto seja aprovado no Congresso ainda neste ano?

É fundamental tirar o peso do Estado das costas dos pagadores de impostos. O Brasil precisa demais de três reformas: a tributária, a política e a administrativa, além das privatizações. Critica-se muito a equipe econômica porque não andou com as privatizações, mas o problema é que não depende só dela. Depende de um monte de fatores e de quem não está interessado em contribuir para isso. A gente só vai conseguir reduzir o peso do Estado para valer, como tem de ser, a partir dessas reformas. Acho que a tributária deve ser aprovada até o fim deste ano, mas provavelmente com uma porção de esparadrapos e remendos.