Corpo a corpo | Luiz Carlos Azedo

26/07/2017 09:48
Corpo a corpo | Luiz Carlos Azedo
- Correio Braziliense
 
A tropa de choque do Palácio do Planalto contaria com 250 deputados, número mais do que suficiente para barrar a denúncia contra o presidente da República, pois bastariam 172 votos a favor de Temer
 
Com a caneta cheia de tinta, o presidente Michel Temer tenta convencer os deputados indecisos a votarem contra a aceitação da denúncia do Ministério Público Federal (MPF), na qual é acusado de receber propina da JBS, com base em gravação de conversa com o empresário Joesley Batista, a quem recebeu fora da agenda, no Palácio do Jaburu, onde reside. Nesse corpo a corpo, Temer é um craque. Foi assim que se elegeu por três vezes à Presidência da Câmara, cujos humores conhece bem. Quem é político sabe, um pedido pessoal do presidente da República, olhos nos olhos, não é coisa fácil de ser recusada, ainda mais porque acaba sendo um divisor de águas no relacionamento com o governo, principalmente para os parlamentares da base.
 
A votação da denúncia é como um labirinto político no qual aos acordos do impeachment, que somente Temer conhece, são o fio de Ariadne. Inspirado na lenda de Teseu e o Minotauro, o termo é usado na lógica para descrever a resolução de um problema que se pode proceder de diversas maneiras óbvias, através de tentativas e erros, desde que você possa voltar ao ponto de partida. Temer já tem votos suficientes para barrar a denúncia e restabelecer, ao menos temporariamente, sua blindagem contra a Operação Lava-Jato.
 
Estimam os articuladores do governo que a tropa de choque do Palácio do Planalto conta com 250 deputados, número mais do que suficiente para barrar a denúncia, pois bastariam 172 votos a favor de Temer. O problema é o governo mobilizar 342 parlamentares para encerrar o assunto em 2 de agosto, data prevista para votação. Esse é também o número de votos necessários para que a denúncia possa ser aceita e siga apreciada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), conforme reza a Constituição.
 
A estratégia dos parlamentares que defendem a admissibilidade da denúncia é não dar quórum para votação e aguardar uma nova denúncia do Ministério Público Federal. Pretendem comparecer ao plenário, mas não registrar presença no painel. Essa é uma estratégia de risco, normalmente usada pela minoria. Só assim será possível saber se o governo terá a força necessária para colocar em plenário os 342 deputados necessários para iniciar a votação.
 
É aí que o corpo a corpo de Temer pode ser eficaz para convencer deputados da base que foram pressionados a votarem pela admissibilidade da denúncia por suas bases eleitorais a dar o quórum para a votação e, depois, votar contra. Assim, ajudariam o governo a blindar Temer, ao mesmo tempo em que votariam a favor da continuidade da denúncia. Com quórum baixo, os 250 votos de Temer liquidariam o assunto. O nome disso é convergência secundária, muito comum no parlamento. Há mais deputados interessados numa solução desse tipo do que sugerem os discursos dos líderes da oposição.
 
Lava-Jato
Temer liquidaria o assunto em termos. Por dois motivos: primeiro, a denúncia não morre com a votação, fica congelada até que o mandato do presidente da República se encerre; segundo, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tem mais uma denúncia contra o peemedebista, que deve oferecer antes de encerrar seu mandato à frente da PGR, o que levaria à desgastante reprodução de todo o processo. Caso isso realmente ocorra, o Palácio do Planalto terá que gastar mais tinta da caneta de Michel Temer. Isso significa fechar os olhos para projetos girafas em tramitação no Congresso, novas nomeações de apadrinhados e liberação de mais verbas, porque o balcão do toma lá dá cá será reaberto.
 
Quem tinha ilusões de que a Operação Lava-Jato seria sufocada após a saída de Janot da procuradoria-geral pode tirar o cavalinho da chuva. Ontem, com o apoio da nova procuradora-geral, Raquel Dodge, o Conselho Superior do Ministério Público Federal aprovou, por unanimidade, orçamento do Ministério Público Federal para 2018 e destinou R$ 1,6 milhão para a força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba. Neste ano, com as suplementações, o orçamento foi de R$ 1 milhão. A proposta orçamentária do MPF para 2018 é de R$ 3, 843 bilhões, sendo mais de R$ 3 bilhões em gastos com pessoal. Mas esse Orçamento precisa ainda do aval do Executivo e do Congresso.
 
Entretanto, haverá realmente uma inflexão na condução das investigações da Operação Lava-Jato. Com a elite política do país no pelourinho das delações premiadas, as articulações do Palácio do Planalto no Congresso e junto ao Judiciário para conter o ímpeto das investigações e limitar a atuação da força-tarefa vão recrudescer. Além, disso, com a posse de Raquel Dodge, a partir de setembro, ascenderá ao comando da PGR um grupo de procuradores preocupados com a tensão entre a instituição e os Poderes da República e dispostos a corrigir eventuais excessos da força-tarefa da Lava-Jato.