Desafios do jornalismo - Por Carlos Alberto Di Franco

04/12/2017 21:50
Desafios do jornalismo
 | Pixabay
A revalorização da reportagem e o revigoramento do jornalismo analítico devem estar entre as prioridades estratégicas
 
Por Carlos Alberto Di Franco
 
Eu estava meio encolhido na sala de embarque do aeroporto de Vitória. Cheguei antes do horário. Era uma aperto só. De repente, na minha frente, brota um grande amigo: Rosental Calmon Alves. Esqueci o cansaço, as filas e a demora. Passamos em revista os problemas do mundo e do jornalismo. O entusiasmo do Rosental faz bem a qualquer um. Ganhei meu dia.
 
O jornalista Rosental Calmon Alves é um fenômeno de renovação permanente. Começou sua carreira de jornalista em 1968. Entre outros veículos, passou pelas rádios Tupi e Nacional, no Rio de Janeiro, e pelas revistas IstoÉ e Veja. No Jornal do Brasil, foi correspondente em Madri, Buenos Aires, Washington e Cidade do México. Em 1995, foi o responsável pelo lançamento da primeira versão para a internet de um jornal brasileiro: O JB Online. Um ano depois, trocou as redações pela carreira acadêmica, tornando-se professor na Universidade do Texas, em Austin. Em 2002, criou o Centro Knight para Jornalismo nas Américas.
 
Rosental, um carioca simpático e acolhedor - tenho saudade de nosso encontro em Austin-, surpreende por sua capacidade de adaptação às mudanças. Considerado um dos grandes teóricos do jornalismo online, Calmon Alves sempre chamou a atenção para os desafios a serem enfrentados pelos jornais neste momento de revolução digital.
 
Menos Brasília e mais vida. Menos aspas e mais apuração
Segundo Rosental, o surgimento das redes sociais, como o Twitter e o Facebook, não mudou somente o jornalismo, mas também o mundo. “Nunca antes os avanços tecnológicos nos afetaram tanto e, consequentemente, afetaram a forma de fazer jornalismo”, observa. “Há mais de uma década que eu venho alertando para isto: não dá mais para continuar fazendo jornais do mesmo jeito”.
 
Essa é uma nova realidade que as grandes empresas de mídia precisam aceitar, pondera: “Hoje a comunicação não é mais vertical, unidirecional, com a internet ela passou a não ter limites. Outra diferença é que a audiência não é mais passiva, não se trata mais de um monólogo, é preciso haver uma constante troca de informações entre os leitores e o jornal”.
 
Rosental Calmon Alves vai ao ponto. Precisamos, todos, fazer uma urgente autocrítica. E a primeira reflexão nos leva a depor as armas da arrogância e assumir a batalha da humildade. A comunicação, na família, nas relações sociais e no jornalismo, não é mais vertical. O diálogo é uma realidade cultural. Ainda bem. Os oráculos morreram. É preciso ouvir o leitor. Com respeito. Com interesse real, não como simples jogada do marketing. O leitor não pode ser tratado como um intruso.
 
Os jornalistas precisam escrever para os leitores, e não para os colegas. Alguns cadernos culturais parecem produzidos numa bolha. Falam para si mesmos e para um universo cada vez mais reduzido, pernóstico e rarefeito. O jornal precisa ter a sábia humildade de moldar o seu conceito de informação, ajustando-o às autênticas necessidades do público a que se dirige.
 
A imparcialidade (que não é neutralidade) é o melhor investimento
A revalorização da reportagem e o revigoramento do jornalismo analítico devem estar entre as prioridades estratégicas. É preciso seduzir o leitor com matérias que rompam com a monotonia do jornalismo declaratório. Menos Brasília e mais vida. Menos aspas e mais apuração. Menos frivolidade e mais consistência. Além disso, os leitores estão cansados do baixo-astral da imprensa brasileira. A ótica jornalística é, e deve ser, fiscalizadora. Mas é preciso reservar espaço para a boa notícia. Ela também existe. E vende jornal. O leitor que aplaude a denúncia verdadeira é o mesmo que se irrita com o catastrofismo que domina muitas de nossas pautas.
 
É importante que os repórteres e os responsáveis pelas redações tomem consciência desta verdade redonda: a imparcialidade (que não é neutralidade) é o melhor investimento. O leitor quer informação clara, corajosa, bem apurada. Não devemos sucumbir à tentação do protagonismo. Não somos construtores de verdades. Nosso ofício, humilde e grandioso, é o de iluminar a história.
 
Carlos Alberto Di Franco é jornalista.