Entrevista. Roberto Freire, deputado e presidente nacional do PPS

08/05/2016 10:45
‘Senado não pode esperar 180 dias para julgar Dilma’
• Presidente do PPS avaliaque País não suportaráesperar por muito tempo o desfecho total do processo de impeachment
 
Luiz Maklouf Carvalho – O Estado de S. Paulo
 
O deputado federal e presidente do PPS, Roberto Freire – cotado para um ministério no eventual governo Michel Temer –, disse ao Estado que, sendo a presidente Dilma Rousseff afastada do cargo, como espera, o Senado não deve esperar até 180 dias, ou seis meses, para marcar o julgamento definitivo da perda ou não do mandato presidencial.
 
“O Senado deve fazer isso quase de imediato, como foi feito com o Collor”, disse Freire. “O que não pode é o País ficar numa interinidade longa. Já basta o sangramento que nós estamos sofrendo.”
 
No impeachment do então presidente Fernando Collor, em 1992, o Senado demorou 88 dias para decidir – de 2 de outubro, quando houve o afastamento e Itamar Franco assumiu, até 30 de dezembro, quando, por 76 votos a favor e 3 contra, Collor foi condenado à perda do mandato e à inelegibilidade por oito anos. “Esse período é mais do que suficiente”, disse o presidente nacional do PPS.
Pernambucano do Recife, 74 anos, nove netos, Roberto João Pereira Freire está na política desde os anos 60. Entrou pela porta do então clandestino Partido Comunista Brasileiro, o chamado Partidão, filiando-se ao MDB depois do golpe de 1964. Foi uma vez deputado estadual, seis vezes deputado federal – inclusive constituinte, de volta ao PCB – e uma vez senador (1995-2003), já pelo PPS.
Não conseguiu se reeleger em 2014, ficando na quarta suplência. Por várias vezes assumiu o mandato, como neste momento. Com ou sem ele, participou ativamente das articulações contra o governo petista, e foi dos primeiros a defender o impeachment que agora se discute.
 
• O sr. defende maior rapidez para o julgamento definitivo da presidente Dilma, pelo Senado. Mas é preciso combinar com os russos, não?
 
Se for afastada, a presidente não tem que dar mais nenhum pitaco. Não tem que fazer nada. Está afastada. Pode até continuar morando no Alvorada, pode ter algumas regalias, porque ex-presidentes também têm isso, mas é só.
 
• O sr. acha que a presidente afastada vai ficar parada, politicamente falando?
 
É por isso que eu digo: o julgamento não pode demorar. No momento em que você afasta um presidente, a responsabilidade do Senado com o país exige um julgamento de imediato, para saber se ela vai definitivamente se afastar, ou se ela vai voltar. O Senado tem que apressar isso...
 
• Mas como, se a lei determina que pode ser até 180 dias?
 
Pela correlação de forças das votações. A Câmara deu o primeiro passo, com mais de 2/3 dos deputados a favor. A correlação de forças do Senado será definida pela Comissão Especial, pelo plenário, e daí vai a julgamento. Não há porque ficar procrastinando isso, dando embargo de gaveta, sentando em cima, com o País ficar sangrando, e com dois governos. Como é que alguém de bom senso pode imaginar ter um presidente afastado, conspirando, enquanto o Senado demora para marcar o julgamento?
 
• Hoje ainda não existem, que se saiba, os 54 votos necessários para o afastamento definitivo.
 
O Lula também dizia, lá no bunker dele, que ia ter um terço para barrar o processo, na Câmara. Mas não adianta ficar imaginando, porque nunca terá um momento que a gente possa dizer ‘eu agora tenho certeza que vou ter isso’. Não é assim. Não pode ser decidido por ser mais oportuno, por questões menores. O País exige que esse processo se resolva o mais rápido possível, até para saber se ela continua ou se ela vai embora.
 
• Estender por 180 dias ou perto disso pode ser fator de agravamento da situação do País?
 
Claro. De qualquer forma já vai ter uma dualidade. Mesmo com o poder diminuído, afastada, ela vai ficar criando problemas. Você não pode ter um governo para enfrentar a crise tendo um outro governo tentando impedir que você resolva os problemas.
 
• Mas os até 180 dias são um direito que a presidente afastada tem.
 
E eu estou querendo, dentro da Constituição, apressar, como foi feito no Collor. Qual é o problema? Não estou atropelando nada. O direito de defesa dela está totalmente garantido.
 
• Como o Senado vai poder apressar o prazo?
 
No momento em que o plenário decidir que deve ser instalada a sessão de julgamento, cabe à presidência determinar uma data para a realização dessa sessão. Pronto. Se a maioria do Senado determina, você cumpre. Não pode procrastinar essa decisão. Se não tiver os 2/3, não terá impeachment. É simples. O que eu quero é que se convoque a sessão para decidir. Quem está sangrando não é Dilma. Dilma é que está sangrando o País. Tem onze milhões de desempregados sem nenhuma perspectiva de como se vai resolver isso. Não é que um novo governo vai resolver, mas um novo governo abre a perspectiva de discutir o enfrentamento da crise e talvez a solução. Quem disse que não? Mas com este desgoverno que aí está não tem nenhuma perspectiva de você enfrentar essa crise. Ao contrário, ela só se aprofunda.
 
• O sr. é otimista com um possível governo Temer?
 
Eu sou otimista pela mudança. Tem determinados momentos que você tem que mudar – até para poder despertar a capacidade de como enfrentar crises e resolvê-las. O simples momento da mudança desperta, na sociedade, aquele espaço do mínimo de confiança: vamos saber o que pretendem fazer. Daí a responsabilidade de ter um bom Ministério, que responda para a sociedade afirmando determinados valores. O Temer está tendo o cuidado de colocar, por exemplo, que em nenhum momento haverá qualquer obstáculo ou empecilho para aquilo que está sendo investigado no País.
 
• Qual vai ser o seu ministério?
 
Meu? Eu não sei. O que eu sei, que foi falado, é que ele gostaria de ter o PPS participando do governo dele, inclusive a nível ministerial. Desde o Itamar nós defendemos que o governo que surge com o impeachment é de responsabilidade direta das forças políticas que votaram a favor do impeachment. Ninguém pode votar a favor do impeachment e depois fazer o que o PT fez com o Itamar, ir pra oposição. Isso é uma irresponsabilidade.
 
O governo tem carimbado fortemente o vice-presidente Michel Temer como conspirador e traidor. O que o sr. acha?
 
Esse governo, e o PT, não tem o mínimo respeito com a sociedade democrática. Quer dividir a sociedade entre amigos e inimigos – o que é próprio de uma mentalidade fascista. Temer era alguém que inclusive ajudou tremendamente Dilma, a ponto de entregarem a ele a articulação política. Foi escolhido por eles, foi votado por eles, não adianta vir questionar a legitimidade do voto, porque ele teve a mesma legitimidade que Dilma. O sistema eleitoral brasileiro dá a ele a quantidade de votos que deu a titular. O Temer merecia, da parte deles, reverência e respeito. A partir do momento que discorda, passa a ser o traidor, o inimigo, e precisa desconstruí-lo, destruí-lo. Mas essa é uma prática que o PT vem tendo em relação a todos aqueles que não concordam ou que dele se afastam.
 
O sr. foi um quadro importante do partido comunista há alguns anos, e depois mudou a sua posição.
 
O mundo mudou a sua posição. O que me move, nesse problema que nós estamos vivendo hoje no Brasil, é o mesmo sentimento que o PCB teve no fim da ditadura. Nada de revanchismo. Tem que apurar, investigar, não esquecer, mas nada de revanchismo. A mesma coisa tem que ser agora: não tem que ter espírito de revanche nenhum, pelos 13 anos do PT, nada disso. Nós temos que cuidar é do futuro.